sábado, setembro 02, 2023

Terra Sonâmbula e uma perspectiva de identidade nacional aplicável ao Brasil

Introdução

 

Oi, gente! Como vocês estão? Sentiram falta desse humilde blog? Eu espero que sim porque eu senti (risos). Sim, senti um vazio terrível nesse hiato de 4 meses, por isso voltei. Quero continuar compartilhando com vocês minhas experiências estéticas e quero também que as compartilhem comigo das suas, por meio das indicações feitas.

Aliás, não as esqueci e, a partir do dia 16, serão minhas prioridades. Por que já não desde essa semana, Bia (sim, esse é meu apelido – finalmente saio em parte do anonimato -)? Ou desde a próxima? Porque essas duas primeiras semanas de retorno serão destinadas à identidade brasileira. Afinal, vem aí o 7 de setembro.

A brasilidade é assunto de bastante interesse a leitores brasileiros deste espaço e à própria escritora. Na verdade, os problemas e as soluções do Brasil podem-se estender a vários países do mundo.

Lembram o nome do blog: Arte Transcendente? Isso significa que o que aqui é tratado desvela-se desde uma perspectiva que ultrapasse barreiras, que supere obstáculos, inclusive nacionais. Afinal, somos todos humanos, filhos de Deus.

Pois bem.

Durante esse período de ausência, consumi muita coisa (ora obrigada pela facul, ora fugitiva das imposições universitárias). O texto escolhido para recomeçar as dissertações é da primeira espécie de conteúdos. E, graças a Deus, não foi uma inutilidade a mais: de fato, fez-me pensar nas similaridades entre essas duas colônias portuguesas.

Ora, para que questionar-se sobre isso? Não se sabe sem dúvida que ambas são frutos lusófonos e subdesenvolvidos de uma colonização de exploração? As semelhanças, meus amigos, vão muito além disso: ambas têm problemas para desenvolverem-se porque não chegam a um consenso de identidade nacional.

 

A questão da identidade nacional

 

Quando pesquisamos por “identidade” no Michaelis Online, a primeira definição que ele nos concede é:

“Estado de semelhança absoluta e completa entre dois elementos com as mesmas características”.

De fato, ao pensarmos em uma “identidade nacional”, sugerimos aspectos comuns aos vários habitantes de uma nação que os permitam manterem-se tolerantemente unidos sob um mesmo Estado.

É por isso que Ernest Laclau (citado por Stuart Hall em seu livro A identidade cultural na pós-modernidade) acredita que a verdadeira identidade nacional estabelece-se quando os indivíduos são capazes de articularem-se circunstancialmente e parcialmente em meio as suas diferenças.

 

Terra Sonâmbula, de Mia Couto

 

Gente, esse foi o melhor livro que li por exigência da graduação e a ela sou grata. Publicado no ano de conclusão da guerra civil iniciada em terra moçambicana após livrar-se do direto domínio português, revela as mazelas daquela pós-independência e, arrisco-me a dizer, do comportamento humano.

Desenha uma nascente, difusa e confusa realidade nacional em que todo o organismo social transitava entre passado e futuro, tradição e progresso, indivíduo e sociedade, egoísmo e fraternidade, tribo e país, nacionalidade e naturalidade, raça e humanidade...

Obs.: esse jogo de oposições nem sempre indica que a consideração de um dos elementos é boa e a do outro, ruim. A vida é mais do que feita de preto e branco: ela tem muitos tons de cinza. A beleza principal desse livro é, paradoxalmente, deixar, com sutileza, bem claro esse processo.

Por exemplo: como podemos pertencer a algo se não existimos nem nos conhecemos? Como podemos pensar em um bom futuro se não conhecemos nem reconhecemos os erros do nosso passado? Como pensar em progresso se não conhecemos nossas raízes (é como construir paredes sem alicerce)?

Vocês podem conferir a íntegra do livro aqui.

 

Brasil x Moçambique

 

Apesar de essa terra latino-americana possuir um governo próprio há mais tempo que a nação africana, ambas possuem sociedades fragmentadas que foram reunidas e subjugadas violentamente.

Lembro-me do Brasil em período eleitoral ao ler o seguinte trecho de Terra Sonâmbula, no qual o deuteragonista Kindzu reflete sobre a guerra corrente:

“Agora, eu via o meu país como uma dessas baleias que vêm agonizar na praia. A morte nem sucedera e já as facas lhe roubavam pedaços, cada um tentando o mais para si. Como se aquele fosse o último animal, a derradeira oportunidade de ganhar uma porção." (p. 14)
Quantas atitudes xenofóbicas e racistas temos ainda em nosso país, em pleno 2023, tal como havia em 1992 em Moçambique! Quanta hostilidade encontramos entre habitantes de regiões distintas no Brasil! O quanto nos afetam as polarizações ideológicas que escancaram a fragmentação nacional! E quanta traição e mentira tudo isso gera!

A boa notícia é anunciada e mimetizada pelo casal Farida e Kindzu, sobre o qual se relata:

"Entendia o que me unia àquela mulher: nós dois estávamos divididos entre dois mundos." (p. 72).

Sim, o brasileiro e o moçambicano estão divididos, interna e externamente, entre dois, três, mil mundos. E é isso que os faz “idênticos”. É isso que permitiu a eles, cada um numa parte diferente do mundo, constituírem suas nações com aqueles que se acercavam, tais e quais lusitanamente dominados.

 

Conclusão

 

Assim, quando deixarmos de pensar mais em nossas diferenças que em nossas semelhanças, quando libertarmo-nos do nosso egoísmo e pensarmos na beleza e na riqueza cultural que Deus e a história uniram como nação, quando nos incluirmos numa luta comum mais do que brigarmos uns contra os outros...

Enfim, seremos capazes de tornar o Brasil (para nós brasileiros, Moçambique para os moçambicanos) um lugar melhor de viver-se, construindo juntos um projeto nacional, sobre o qual comentarei melhor na próxima semana ao indicar outra obra literária.

Fiquem bem e até o próximo sábado, voltando à rotininha das 19:00!

Se quiserem comentar algo sobre o texto ou dar sugestões de novas obras (que, reforço, demoram a ser atendidas, mas não são olvidadas), fiquem à vontade!

 

5 comentários:

  1. Querida Bia. Que reflexão bonita, fundamentada e sábia. Surpreende-me, e porque não dizer, espanta-me, a sua maturidade mental e intelectual! Uma grata surpresa em cada texto seu, que me enchem de orgulho dos jovens por você representados.. Até o próximo ensaio! Beijo

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    1. Obrigada, Desirée! Honra em receber um comentário assim de você!

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  2. Bia que texto excelente e profundo. Impressionante seu entendimento sobre o assunto abordado.

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  3. Ameii conhecer
    Irei visitar esse cantinho mais vezes 🥰 Sou Kelliane do Grupo de Oração
    Parabéns Bia

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